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  • Foto do escritorJoão Alberto Gonçalves Salvador

Luto: suas fases e faces.

(...) E a natureza, se do meu coração não se esvaziou o amor pela Laura, estaria numa aniquilação imediata para mim também, poupando-me à miséria de ver o sol que arde sem respeito por qualquer tragédia."
(A máquina de fazer espanhóis - Valter Hugo Mãe)

Quando escrevi este post em meados de 2019, vivíamos naquilo que chamamos de velho normal, sem máscaras (só personas), nos abraçando, aglomerando em festas e eventos. Nem imaginávamos o que viria meses depois. A pandemia de Covid-19 caiu como uma bomba mundo a fora e no Brasil exibiu contornos trágicos. Hoje, 20 meses após a primeira morte por Covid-19, mais de 600 mil vidas perdidas, ainda sob a sombra da pandemia e assistindo, incrédulos, uma tragédia social e econômica, decidi repostar esse texto.

Em diversos momentos, experimentamos situações de perdas ou separações, muitas delas significativas como o término de um relacionamento, a perda de um emprego, uma doença grave ou a morte de um ente querido. Em todas essas situações, vivenciamos um sofrimento psíquico. A esse sofrimento decorrente de uma perda damos o nome de luto, que além expressar a dor dessa perda significativa, também é um processo de readaptação diante consequentes mudanças.

Trata-se da experiência na qual busca-se dar continuidade na vida sem a pessoa ou objeto que deixou de fazer parte de nossa vida. No caso da morte de um ente querido, que será o foco deste post, a dor tem início com a consciência da inevitabilidade e irreversibilidade da morte, até então negada. Uma enxurrada de sentimentos toma de assalto o enlutado, que busca desesperadamente encontrar um novo sentido para uma vida sem aquele que se foi.

Mesmo com essa crença, o processo de luto não deixa de ser doloroso e difícil de digerir e passa por 5 etapas ou fases, conforme a psiquiatra suíça Elisabeth Küblr-Ross. São elas:

1. NEGAÇÃO e ISOLAMENTO: são mecanismos de defesa do Ego diante do sofrimento psíquico diante da realidade imposta pela morte do ente querido, onde a intensidade e duração vão depender da estrutura de cada um que vivencia o luto. Vale ressaltar que, no primeiro momento, torna-se difícil acreditar no ocorrido, até que se veja o corpo ou algo que caracteriza a morte. Por isso a importância de se buscar, com a mesma determinação, sobreviventes e vítimas fatais em tragédias, como a ocorrida recentemente em Brumadinho-MG, onde se desprende grandes esforços para garantir a dignidade do sepultamento, bem como a assimilação dessa perda.

2. RAIVA: quando o Ego se vê impossibilitado de manter os mecanismos anteriores, a pessoa passa a expressar seus sentimentos de raiva, revolta, hostilidade e ressentimento contra tudo que é externo (ambiente, relacionamento, Deus...).

3. BARGANHA: surge com o fracasso dos mecanismos anteriores no sentido de solucionar sua dor, o enlutado tenta fazer algum acordo com suas emoções. Na maioria dos casos ocorre em segredo.

4. DEPRESSÃO: aí começa o sofrimento profundo, onde os sentimentos de tristeza, medo, culpa, falta de esperança e desolação passam a fazer parte da rotina, com o fracasso das demais fases. Nessa fase, a perda também é sentida fisicamente e a pessoa, na maioria dos casos, passa a adotar uma atitude mais introspectiva.

5. ACEITAÇÃO: trata-se do desfecho do processo de luto. Não há mais a negação do fato, agressão, trocas a pessoa encontra-se consciente de sua realidade e se dispõe a lidar com sua perda. Nesse estágio, o enlutado está pronto para buscar a elaboração de sua perda, bem como buscar um sentido para sua vida, mas a tristeza ainda se faz presente.

De qualquer forma, o processo de elaboração do luto, demanda tempo, paciência e esforço pessoal do enlutado, no intuito de encontrar um novo sentido de vida sem aquele que se foi, sendo importante uma atitude flexível e aberta às mudanças. Assim, a psicoterapia Junguiana pode auxiliar a pessoa enlutada a encontrar esse novo sentido de vida, através de uma visão simbólica da perda, para que este possa se fortalecer e seguir em frente, pois entre o nascimento e a morte, existe um livro a ser escrito, o qual chamamos de vida, onde personagens entram e saem, deixando sua marca. Aos que ficam, resta reencontrar seu papel, pois a história não acaba e a vida continua.

Dedico este texto a M. A. S. (1920 – 2019), T. B. R. (1925 - 2020) e todos que de forma natural ou não encerraram sua participação nessa grande peça chamada vida, em especial às mais de 600 mil vidas perdidas pela pandemia de Covid 19.


Abraço a todos!


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